sábado, 12 de janeiro de 2013

O Julgamento Moral Da Criança






            Jean Piaget foi um psicólogo suíço, fascinado pela questão do desenvolvimento mental da criança. Em que idade ela começa a entender conceitos como " meu " e " teu " ? Que tipo de compreensão tem ela de tempo e espaço, verdade e faz de conta, ao longo das diferentes idades ? Sua pesquisa provocou prateleiras de livros sobre o processo do pensamento infantil.
            " O Julgamento moral da Criança " trata da concepção infantil do certo e do errado, do que é permitido e do que é proibido. Piaget tinha um método desconcertante de pequisa. Costumava sair pelas ruas de Genebra, aproximar-se  crianças que brincavam com bolas de gude e perguntar três coisas:

  - Que idade você tem ?
  - Como é que você joga bola de gude ?
  - Como é que você sabe que esta é a maneira certa de jogar ?


          O que descobriu com isto foi a atitude das crianças de diferentes idades, a respeito de regras de qualquer espécie, da autoridade religiosa e secular, da seriedade da transgressão às regras e como praticá-las. Piaget descobriu que há três estágios na evolução do sentimento de autoridade da criança.
         As mais novas vêem as regras de um jogo e, por extensão, todas as regras que conhecem, como expressão de uma autoridade maior, inquestionável. É assim que se joga e se comporta, e nunca lhes ocorre fazer as coisas de  maneira diferente. Piaget perguntava a estas crianças mais novas:  " Por que é que você tem que fazer assim ? E se você jogasse de algum outro jeito? " As crianças olhavam sem compreender e respondiam: " Mas não seria certo. Se fizesse assim, não seria mais um jogo de gude ". Regras são regras e é através de sua aceitação e da obediência a elas que se faz parte do sistema.
         A medida que crescem e se aproximam da adolescência- descobriu Piaget- as crianças começam a questionar estas regras e, na realidade, a questionar qualquer tipo de autoridade. Não precisam ser induzidas pela pergunta de um adulto. Elas próprias se perguntam: " Quem é que diz que tem que ser assim ? O jogo é nosso; por que não fazemos as regras que queremos ?" Tipicamente, as crianças atravessam então uma fase irresponsável, inventando mais regras bobas, fazendo com que o jogo se torne tão fácil que perde seu encanto ou tão difícil da forma a tornar-se impossível de jogar, até chegarem à conclusão de que têm poder para estabelecer e mudar as regras, mas estas têm de ser inventadas de forma a fazer com que o jogo seja justo e razoável, porque, caso contrário, ele não terá a menor graça.
         Neste momento, diz Piaget, elas estão na fronteira da maturidade. Compreendem que as regras não vêm " de cima ". As regras são feitas por gente com o elas, testadas e aperfeiçoadas ao longo do tempo, e podem ser modificadas por gente como elas. Ser " bom" não significa apenas obedecer às regras. Passa a significar a participação na responsabilidade de avaliar e estabelecer regras que sejam justas pra todos, de forma a que possamos gostar de viver numa sociedade justa e igualitária. 
         Piaget sugere que estes comportamentos em relação ao jogo de gude sejam um paradigma de nossas atitudes a respeito de todas as regras e toda a autoridade. Quando somos jovens e fracos, visualizamos a fonte das regras como onipotente e oniscientes. Demonstramos nossa apreciação pela orientação através da aceitação e obediência às regras. Uma criança " boa " não é necessariamente uma criança generosa ou moralmente sensível, mas sim dócil e obediente. Nesta fase, temos dificuldade para aceitar a ideia de que outros povos, outras culturas, outras religiões tenham regras diferentes das nossas. Se estamos certos e eles são diferentes, então devem estar errados. Nós somos a norma; eles são " estranhos " ou exóticos se comem de maneira diferente, se vestem ou oram de forma diversa da nossa. Usar argolas nas orelhas é normal- usá-las no nariz é bizarro.

         As crianças chegam à adolescência e de repente se desinteressam por serem julgadas " boas ". A obediência, que traz consigo a aprovação dos pais, deixa de ser o valor mais alto. Como as crianças do segundo estágio de Piaget, que faziam bobagens com seu jogo de gude até descobrirem que isto, na verdade, não tinha graça, os adolescentes também fazem muitas bobagens, às vezes machucando a si próprios ou aos outros, no processo de bravatear até que ponto são independentes das regras, Como sabe qualquer pessoa que tenha educado um adolescente, sua tendência é a de rejeitar bons conselhos, em lugar de dar ouvidos a pais e outras figuras de autoridade. Essa é sua ideia de "liberdade" .
         Finalmente, se tiverem sorte, os adolescentes crescem e se transformam em adultos responsáveis, homens e mulheres cuja noção de " bom " terá mais significado que a obediência. Ser " bom " corresponde a avaliar e ajustar as regras, usando o próprio poder no interesse da justiça.

                                                                                                                        Jean Piaget

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